O
Ministério Público é um órgão da função judicial, previsto na Constituição e na
lei (no que toca ao contencioso administrativo a sua previsão basilar está no
artigo 51.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais). É-lhe
incumbida a representação do Estado e a defesa da legalidade democrática. A
Constituição prevê, também, no seu artigo 219.º/1, a participação na execução
da política criminal definida pelos órgãos de soberania e o exercício da ação
penal orientada pelo princípio da legalidade. Como órgão do sistema judicial
português, o MP possui um Estatuto próprio – Lei nº 47/86, de 15 de Outubro. É
um órgão composto por magistrados hierarquicamente subordinados – 219.º/4 da CRP
– e que tem como órgão superior, a Procuradoria-Geral da República – 220.º/1 da
CRP.
Um
dos domínios da defesa da legalidade democrática será o da fiscalização
judicial do exercício do poder administrativo. Através do artigo 5.º do
Estatuto do Ministério Público (EMP), é possível observar, nas suas variadas
alíneas, que o MP prossegue, indiferentemente, a defesa de interesses públicos,
ou privados, desde que protegidos pelo ordenamento: está em causa a defesa dos
reais interesses das pessoas.
Como
exemplos de preceitos legais nos quais o MP é protagonista temos: logo em
primeiro lugar o artigo 9.º/2 do CPTA que concede ao MP uma legitimidade ativa
geral para “propor e intervir em processos principais e cautelares destinados à
defesa de valores e bens constitucionalmente protegidos, como a saúde pública,
o ambiente, o urbanismo, o ordenamento do território, a qualidade de vida, o
património cultural e os bens do Estado, das Regiões Autónomas e das autarquias
locais, assim como para promover a execução das correspondentes decisões
jurisdicionais.”
O
artigo 55.º/1/b) do CPTA, que permite ao MP ter legitimidade ativa para impugnar
atos administrativos; o artigo 62.º/1 do CPTA permite, aquando da desistência
ou outra circunstância própria do autor, que o MP dê continuidade à instância,
no exercício de ação pública, assumindo a posição de autor; o artigo 68.º/1/b)
do CPTA permite que o MP tenha legitimidade para pedir a condenação à prática
de um ato administrativo, quando estão em causa ofensas de direitos fundamentais,
defesa de interesses públicos, ou os valores protegidos pelo artigo 9.º/2 do
CPTA; o artigo 73.º/3 do CPTA dá legitimidade ao MP para que, quando estiver em
causa a produção de efeitos de uma norma através de um ato administrativo de
aplicação, possa suscitar a questão da ilegalidade da norma aplicada no âmbito
do processo dirigido contra o ato de aplicação, pedindo a desaplicação da
norma. O MP tem ainda o dever de pedir a declaração de ilegalidade com força
obrigatória geral quando tenha conhecimento de três decisões de desaplicação de
uma norma com fundamento na sua ilegalidade, bem como de decorrer das decisões
de primeira instância que declarem a ilegalidade com força obrigatória geral –
artigo 73.º/4 do CPTA.
O
artigo 77.º/1 do CPTA permite que o MP possa pedir ao tribunal administrativo
competente que aprecie e verifique a existência de situações de ilegalidade por
omissão das normas cuja adoção, ao abrigo de disposições de direito
administrativo, seja necessária para dar exequibilidade a atos legislativos
carentes de regulamentação. O artigo 85.º do CPTA refere a intervenção do MP,
salvo quando este figura como autor. Se estiverem em causa os valores
defendidos pelo artigo 9.º/2 do CPTA, o MP pode pronunciar-se sobre o mérito da
causa e nos processos impugnatórios pode invocar causas de invalidade diversas
das que tenham sido arguidas na petição inicial e solicitar a realização de
diligências instrutórias para a produção de prova. O artigo 141.º do CPTA, concede
legitimidade ao MP para, quando houver uma decisão proferida com violação de
disposições ou princípios constitucionais ou legais, interpor recurso ordinário
dessa decisão jurisdicional. O artigo 146.º/1 do CPTA permite que o MP, quando
não se encontra no papel de recorrente ou recorrido, possa ser notificado pela
secretaria do tribunal, para, em 10 dias, este se pronunciar sobre o mérito do
recurso, em defesa dos direitos fundamentais do cidadão, de interesses públicos
especialmente relevantes ou de algum dos valores ou bens defendidos pelo artigo
9.º/2 do CPTA. Por fim, os artigos 152.º/2 e 155.º do CPTA dão legitimidade
para a interposição de recursos jurisdicionais de decisões ilegais, de recursos
para uniformização de jurisprudência e de recursos de revisão.
Após
a análise destes preceitos legais, a título meramente exemplificativo, é-nos
possível observar as funções primordiais do Ministério Público no Contencioso
Administrativo, assim como, o seu modus
operandi. Em primeiro lugar podemos
concluir que o modelo de intervenção do MP português no contencioso
administrativo é consistente, nos planos orgânico e funcional, com as tarefas
de garantia da legalidade objetiva, e também subjetiva, que, por imperativo
constitucional e legal, à jurisdição cumpre prosseguir. É um modelo que que se
mostra bastante vocacionado para garantir a prossecução, com imparcialidade,
dos interesses gerais da coletividade. Como primeira função temos a
representação do Estado – artigo 11.º/1 do CPTA, artigo 3.º/1/a) do EMP, nas
ações administrativas, ou seja, um autêntico patrocínio judiciário. Em segundo
lugar, através das ações públicas, o MP defende os interesses da coletividade,
tendo em conta a legalidade democrática, e por último, como consequência destas
duas primeiras funções, o MP promove a realização do interesse público (artigo
51.º do ETAF).
Bibliografia:
Almeida, José Manuel
Ribeiro de, “Uma Teoria de Justiça” –
Justificação do Ministério Público no contencioso administrativo, Lisboa,
2000;
Almeida, Mário Aroso de, Manual de Processo Administrativo, 2ª edição,
2016, Almedina.
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