terça-feira, 1 de novembro de 2016

Alegação de interesse direto e pessoal


            Nos termos do artigo 55°/1 a) CPTA, têm legitimidade para impugnar atos administrativos as pessoas que aleguem ser titulares de um interesse direto e pessoal, por terem sido lesadas pelo ato nos seus direitos ou interesses legalmente protegidos.
            A expressão ‘’interesse direto e pessoal’’ aponta no sentido de que a legitimidade individual para impugnar atos administrativos não tem que ter por base a ofensa de um direito ou interesse legalmente protegido, bastando a circunstância de o ato estar a provocar, no momento em que é impugnado, consequências desfavoráveis na esfera jurídica do autor, de modo que a anulação ou declaração de nulidade do ato traga-lhe pessoalmente uma vantagem direta.
            Relativamente ao requisito do caráter “pessoal” do interesse, este diz respeito à legitimidade, pois trata-se de exigir que a utilidade da anulação ou declaração de nulidade de um certo ato seja pessoal, isto é, que o autor a reivindique para si próprio. Já no que respeita ao caráter “direto” do interesse, este refere-se à questão de saber se existe um interesse atual e efetivo no pedido de anulação ou declaração de nulidade do ato que é impugnado. Quer isto dizer que o impugnante tem de se encontrar numa situação efetiva de lesão que justifique a utilização do meio impugnatório.
            Sobre esta matéria debruçou-se o Tribunal Centra Administrativo do Sul, no acórdão de 26/03/2015 Proc. Nº 11891/15.
            Nesta ação as Autoras INFOCOMUNICAÇÕES, S.A. requereram contra a Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública I.P. a suspensão da eficácia do ato de adjudicação para a celebração de contrato de serviços de comunicações unificadas de voz fixa, voz móvel e de contact centre.
            Na ação proposta em 2014 o TAC de Lisboa absolveu a entidade requerida e as contrainteressadas da instância, por falta de legitimidade e de interesse de agir, pelo que as autoras recorreram para o TCA Sul.
            O interesse em agir consiste na necessidade objetiva, séria e atual demonstrada por factos concretos, de agir em juízo para defesa de uma posição jurídica substantiva, isto é, um direito ou interesse legalmente protegido. O TCA fundamentou a sua decisão no carecimento do tal interesse de agir, decisão contestada pelo autor, alegando que a circunstância de não ter apresentado proposta ao concurso ( Aquisição de Serviços de Comunicações purificadas de Voz Fixa, Móvel e de Contact Center, tipo CENTREX) não lhes retira legitimidade para impugnar a decisão de adjudicação do mesmo. As recorrentes invocam que o ato que determinou a abertura do concurso, como as características que o mesmo reveste, as impedirá de apresentar propostas ao dito concurso por não serem detentoras de licença de redes móveis, pelo que se deve entender que elas, apesar de não poderem concorrer, têm legitimidade para impugnar, logo, também para pedir suspensão de eficácia de decisão de adjudicação do concurso em apreço.
            Defendeu no entanto o Recorrido que as Recorrentes fundamentam a sua legitimidade ativa nos reflexos indiretos que o Concurso porventura produzirá na atividade económica que estas  desenvolvem. Significando isto que não existe uma efetiva lesão que se repercuta na esfera jurídica das Recorrentes, causando-lhes direta e imediatamente prejuízos, pelo que não existe qualquer interesse direto e pessoal que justifique a necessidade de tutela jurídica. Alegam também que o facto de que as Recorridas não podiam figurar como opositores ao Concurso, uma vez que se auto excluíram do mesmo, pelo que não é legítimo pedir ao Tribunal que anulasse o ato de adjudicação e determinasse a reformulação do objeto do Concurso para que as Recorrentes pudessem apresentar a sua proposta. Atendendo assim ao último facto, conclui-se que as Recorrentes carecem de legitimidade para impugnar o ato de adjudicação bem como de benefício direto e imediato na sua esfera jurídica.
            Apreciando esta ação, o TCA Sul indeferiu a pretensão cautelar formulada e o incidente de declaração de ineficácia de atos de execução indevida.
            Parece-nos que a decisão do Tribunal em favorecer o Recorrido tenha sido a mais correta, uma vez que o interesse direto deve ser apreciado em função das vantagens que o autor alega poderem advir-lhe da anulação do ato, sendo que os efeitos devem traduzir-se de forma direta e imediata na esfera jurídica do impugnante, situação que não ocorria no caso em apreço. Também o facto de as autoras terem desistido de participar no concurso demonstra a perda de interesse em agir na ação, como refere o Acórdão do TCA Sul de 01.12.2012, Proc. Nº 07802/11: “...O desinteresse do concorrente na adjudicação da sua proposta expresso por requerimento no procedimento concursal tem como consequência a perda de interesse em agir na acção de contencioso pré-contratual por si instaurada, obsta ao conhecimento do mérito da causa e importa a absolvição da instância - cfr. artºs. 288° nº 1 e) e 493° nº 2 b CPC, ex vi art º 1° CPTA.”

            Podemos assim concluir que é indiscutível a legitimidade dos concorrentes para impugnar um ato administrativo idêntico, pois a utilidade que eles pretendem obter é uma utilidade pessoal que eles reivindicam para si próprios, uma vez que eles se apresentam como os titulares do interesse em nome do qual atuam processualmente. Já no que respeita a este caso, não sendo as Recorridas efetivas concorrentes do concurso, não são titulares de um interesse direto em impugnar, porque não se encontram, perante este ato em questão, numa situação efetiva de lesão que possa fundamentar uma necessidade de recorrer a tutela judiciária.   

Anna Kalynyuk nº 24237

Sem comentários:

Enviar um comentário

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.